“SOCIALIZAÇÃO FEMININA: quando amor é confundido com DEPENDÊNCIA”
Em 18/10/2024 estreia nas plataformas brasileiras o filme “Maníaco do Parque” e essa nova exposição midiática sobre o “seri@l killer “que chocou o país, na década de 90, nos convida a um olhar mais amplo sobre as nuances humanas pelo viés de gênero. Algumas perguntas se colocam, agora com o distanciamento de mais de 25 anos do ocorrido, nos fazendo refletir sobre os padrões culturais e históricos que atravessam a SOCIALIZAÇÃO DAS MULHERES e sobre como HOMENS (COMO ELE) podem manipulá-las tão facilmente.
No livro “Loucas de ‘amor’ (aspas minhas): mulheres que amam seri@l killers e criminosos sexuais”, o jornalista Gilmar Rodrigues descreve trechos de cartas e depoimentos a respeito das centenas de mulheres que, mesmo após saberem dos atos do “Maníaco do Parque”, demonstraram interesse ‘AMOROSO’ por ele (e por tantos outros que violent@r@m mulheres).
Trecho de uma das cartas:
“Na minha saudade flutuará a necessidade de sempre estarmos juntos (em espírito), como você desejava outrora e mais. Eu quis te amar outrora, você sabe! O rio seguiu seu curso, mas vamos nos encontrar. Peço a Deus todas as noites por ti. Acredite! Sei que você queria me fazer surpresas boas e não más. Você achava que eu não te entenderia finalmente. Lembras? Mas apesar de tudo foi bom ter te conhecido…”
prossegue ela… “Abraçado e beijado tua boca e apertado-te no meu corpo, etc. Acho que você não me esqueceu. Eu serei sempre tua. Não como a mulher samaritana que negou água para Cristo, quero ser sua eterna Lady… Há tempo para tudo, nunca é tarde. Por isso digo que eu te amo. Preciso lembrar que VOCÊ É UM PRESENTE DE DEUS. Você PRECISA DE MIM E EU DE VOCÊ. Ass: Renata
Podemos ser simplistas em julgar as mulheres que se colocam nessa “posição fantasiosa e perigosa”, mas precisamos aprender a complexificar as questões, se quisermos modificar padrões relacionais e comportamentais disfuncionais em todos os âmbitos. Levantarei pontos com referências que podem nos dar algumas pistas:
Valeska Zanello, em seu livro “Saúde Mental Gênero e Dispositivos”, nos convida a refletir sobre a SUBJETIVAÇÃO FEMININA ocorrida por intermédio dos “Dispositivos Amoroso e Materno”. Neles, mulheres aprendem a ser “mulheres de valor”, POSICIONADAS CULTURAL E SOCIALMENTE, apenas quando nutrem amor e cuidados maternos pelos homens e pela família…
… ou seja, elas são VALORIZADAS COMO SERES HUMANOS APENAS NESSAS POSIÇÕES SIMBÓLICAS. A posição de UTILIDADE da mulher fica bem demarcada também, na tese defendida por Silvia Federici em “Calibã e a Bruxa”, na qual descreve como a mulher passou a ter seu VALOR atrelado à UTILIDADE para o sistema capitalista vigente, com sua mão de obra explorada (gratuita) nestes mesmos “papéis de gênero” propostos por Zanello: MATERNAR, CUIDAR, SERVIR e SALVAR os homens de si mesmos.
Trecho de uma das cartas:
“Eu faço de tudo para sair fora da realidade.” “Estou morrendo de saudades de você, para ser sincera nesses últimos três meses tenho sentido muito a sua falta. Lembrando que você foi O ÚNICO HOMEM QUE MAIS ME DEU ATENÇÃO, é disso que mais sinto falta, ATENÇÃO.”
Como então, dentro dos mecanismos simbólicos descritos, mulheres conseguem ser VALORIZADAS E VISTAS COMO SUJEITOS, como seres humanos passíveis de alguma ATENÇÃO E AFETO? Na ânsia por algo que nunca lhes foi dado naturalmente, ficam REFÉNS DA MANIPULAÇÃO e do jogo de sedução proposto por “personalidades” como as do “Maníaco do Parque”.
Trechos de depoimentos:
“Eu recebia presentes, cartas de amor e toda a ATENÇÃO do mundo.” “Gisleine confirma a opinião unânime na fila das visitas de que homem na cadeia é muito ATENCIOSO, gentil, um ‘doce’.” “Reginaldo, apesar das surras que dava e do seu desencanto com as mulheres, TRATAVA-A BEM: quando não cheirava, lhe dava bastante ATENÇÃO.”
Gilmar Rodrigues, após centenas de depoimentos, aponta que: “Pode ser uma lenda, mas já ouvi dizer que, na Argentina, quando chamadas pejorativamente de loucas, as Mães da Praça de Maio, respondiam: “locas si, pero locas de dolor”. Perdoem-me os que só aceitam comparações rigorosas, mas acho que as mulheres retratadas aqui sofreram de muitas dores e são, ao seu modo, ‘loucas de dor’.”
Ele prossegue… “Muitas delas tiveram uma infância de abandono, violências e uma série de desilusões amorosas. Então só lhes resta guardar um sonho futuro, mesmo que tudo dê errado depois. E o que elas têm além de sonhar?”
“Francisco era extrovertido, tinha habilidade de convencimento, deixando que as vítimas descrevessem sua situação atual, geralmente de conflito em seus relacionamentos, para se utilizar destas informações para a conquista e convencimento das garotas (…) a escolha geralmente se concentrava em mulheres com aparente incômodo emocional, as quais o delinquente descrevia como ‘tristes’ e de ‘cabeça baixa’, com aparente suscetibilidade à aproximação de estranhos.”
Podemos dizer que a socialização feminina as coloca em uma posição de PERIGO? Por estarem em busca constante de VALIDAÇÃO, AFETO, ATENÇÃO, CUIDADO E DA FALÁCIA DO AMOR ROMÂNTICO, são colocadas em uma POSIÇÃO SUBJETIVA fantasiosa e ingênua? A ânsia por algo que sustente o vazio existencial e afetivo, seria capaz de ser preenchido pela salvação dos “excluídos”? Quem mais necessitado de “redenção” do que homens como o “Maníaco do Parque”?
Gilmar Rodrigues cita: “Quase todas se mostraram CARENTES, FRÁGEIS, como também são carentes e abandonadas pela vida aquelas que amam homens perigosos. Nos dois casos HÁ UMA ILUSÃO EM CIMA DAQUELE QUE ESTÁ SOB OS HOLOFOTES. Em relação a Sérgio (delegado do caso também assediado), a ilusão de serem salvas e, no caso do Maníaco do Parque, de SALVÁ-LO. Uma tarefa que, por si só, CONFERIRIA IMPORTÂNCIA À MULHER QUE TIVESSE ÊXITO.”
Ficam as perguntas: Como mulheres podem se construir objetiva e subjetivamente de modo que fiquem menos suscetíveis a esse tipo de MANIPULAÇÃO E ABUSO, que em casos mais severos as levam à MXRTE, como ocorreu com as vítimas do “Maníaco do Parque”? Que tipo de “AMOR” (de dependência) É ESSE, ALARDEADO e ensinado NA SOCIALIZAÇÃO FEMININA, QUE COLOCA DEPENDÊNCIA EMOCIONAL EM POSIÇÃO DE IGUALDADE COM AMOR? A quem ele serve?
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Fonte da imagem: Canva